É bem conhecida pelos historiadores a frequente relação entre grandes conflitos regionais ou mundiais e a busca do controle sobre as fontes de energia fóssil, em particular do carvão e do petróleo.
Menos estudado é o consumo de energia mundial para sustentar o aparato militar dos países envolvidos direta ou indiretamente em conflitos, mesmo em tempos de paz. Esse consumo não é uma informação facilmente disponível e confiável. Mas, conforme Departamento de Defesa dos EUA, nesse país em 2006, foram gastos 30.000 GWh apenas em eletricidade. Segundo a mesma fonte, esse gasto saltou para 202.000 GWh em 2018. Isto é da mesma ordem de grandeza de toda a energia elétrica consumida pelo Brasil no mesmo período.
O Ministério da Defesa dos EUA também divulgou que consumia cerca de 17.000.000m3 de combustível por ano, equivalentes a 46.000 m3 por dia. Esse consumo levou, em 2017, a emissões de CO2 estimadas em 59 milhões de toneladas.
Após a Segunda Guerra Mundial, o consumo de energia aumentou drasticamente. Com a proliferação dos veículos automotores, o petróleo ultrapassou o carvão como principal fonte de energia e aumentou o gasto energético mundial tanto em tempos de paz como em conflitos armados. Para se ter ideia, apenas um avião caça supersônico chega a gastar 30 toneladas de combustível por hora.
Não é desconhecido por ninguém o estrago causado por explosões durante um conflito armado. Nesse caso, o importante gasto energético corrido, apesar de grande, é muito inferior ao estrago causado. Além de perdas humanas irreparáveis, são destruídos alvos altamente intensivos em energia. É o uso de energia nobre no aumento da entropia, sem vantagem para ninguém, deixando um legado sinistro para a humanidade.
Se considerarmos, ainda, a energia embutida no ciclo de vida de todos os armamentos bélicos (tanques, aviões e navios, entre outros), o consumo de energia em conflitos se torna ainda muito maior. Lembro “en passant” do recente e desastroso episódio do descomissionamento do porta-aviões brasileiro São Paulo, que fez um passeio à Europa e terminou no fundo do mar, com um gasto enorme de energia.
A produção de amônia também tem uma história peculiar. Ocorre um importante consumo de energia em sua produção, através do processo de síntese HB, que rendeu aos seus desenvolvedores (Haber e Bosch) o prêmio Nobel. É irônico pensar que a síntese da amônia foi ao longo da Primeira Guerra Mundial, mais importante como insumo para a produção de explosivos (como TNT e nitroglicerina) do que como insumo para a produção de fertilizantes. Também aí, o gasto energético com conflitos bélicos se sobrepõe ao nobre uso da energia na produção de fertilizantes para a agricultura. A própria energia nuclear, para fins pacíficos foi, de início, um subproduto da produção de Plutônio utilizado na confecção de artefatos nucleares.
Por fim, é icônico lembrar que o fim da Segunda Guerra Mundial se dá com a explosão de uma Bomba Atômica de 16 quilotons, equivalentes a 1,16 GWh, liberados em poucos segundos em Hiroshima.
A racionalidade no uso da energia não admite a criação de uma economia verde que seja capaz promover uma guerra também verde, perpetuando a incoerência de nossa sociedade na busca de uma economia sustentável ao lado dessa contradição energética. Tem-se a sensação de estarmos evitando que uma torneira pingue, ao lado de outra permanentemente aberta.
A energia é poder e não lhe cabem adjetivos. Bons ou maus são os usos que dela fazemos.
Professor Mario Olavo Magno de Carvalho | Consultor da SER
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